Ayres Brito foi mais importante que Barbosa no julgamento do mensalão, diz professor da FGV

Ayres Britto foi mais importante que Barbosa no julgamento do mensalão, diz professor da FGV

29 de maio de 2014

Por Igor Truz

Apesar de ter se tornado um dos homens mais conhecidos do Brasil após o julgamento e condenação dos réus envolvidos no mensalão, o ministro Joaquim Barbosa não pode ser considerado o maior responsável pelo resultado final da Ação Penal 470. Para o professor de Direito Penal Thiago Bottino, da FGV-RJ (Fundação Getúlio Vargas do Rio de Janeiro), o impacto da atuação de outros ministros, como o ex-presidente da Corte Carlos Ayres Britto (aposentado), foi mais importante para o caso.

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“A influência de Barbosa no resultado final do julgamento deve ser relativizada. Todas as decisões foram colegiadas, dependeram do parecer de outros ministros, que não necessariamente foram profundamente influenciados pelos argumentos de Joaquim Barbosa. A atuação de Carlos Ayres [Britto], no entanto, foi essencial, pois à época ele era o presidente da Corte e foi o responsável por colocar o julgamento em pauta no plenário do STF”, disse o professor.

Então presidente do Supremo em 2012, Carlos Ayres Britto colocou a análise da Ação Penal 470 na pauta de julgamentos do plenário da Corte. Relator do caso do mensalão, o ministro Joaquim Barbosa anunciou nesta quinta-feira (29/5) que deixará o STF no próximo mês.

Além dos outros ministros, o especialista em Direito Penal lembrou que o trabalho de outros órgãos e entidades como o MPF (Ministério Público Federal), a PF (Polícia Federal) e o próprio Congresso Nacional, por meio da realização de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito), devem se levados em conta. “Precisamos enxergar o resultado final como o esforço de um conjunto de setores articulados, não pelo trabalho de uma figura isolada”, disse.

Bottino destacou ainda que, mesmo o fato de Joaquim Barbosa ter se tornado uma figura pública após o julgamento deve ser creditado não somente a ele, mas também ao ministro Marco Aurélio, principal idealizador da TV Justiça. A rede transmite todos os julgamentos do plenário do STF ao vivo, e contou com audiência maciça de telespectadores durante o trâmite da AP 470.

“Contra-legado”

O reconhecido temperamento forte do ministro Joaquim Barbosa, que gerou inúmeros embates, bate-bocas e agressões verbais aos seus colegas de Corte, é entendido pelo professor da FGV-RJ como um ‘contra-legado’ que será deixado pelo atual presidente da Corte. “Não acho que a indelicadeza seja um exemplo a ser seguido. A pessoas podem se posicionar de modo contrário sem agredir o outro. Não é preciso desconstruir quem discorda de você”, disse Bottino.

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Bottino afirmou que, sequer o julgamento do mensalão pode ser considerado em si um benefício, um avanço para a sociedade brasileira. Segundo o penalista, apenas sentenças que afetem um grande número de pessoas, possuem grande relevância social.

O professor rechaçou que o mensalão tenha tido efeitos para além dos réus condenados e disse que não concorda com diversos posicionamentos mais duros adotados por Barbosa como maneira de transformar o julgamento em uma espécie de exemplo do combate à corrupção no País.

“O julgamento do mensalão atingiu um número limitado de pessoas e não gerou efeitos sistemáticos para coibir a corrupção de maneira global. Não concordo com a alegação de que ele foi um exemplo para o combate ao crime no país, pois apenas os réus envolvidos no caso foram punidos”, disse Bottino.

O especialista, no entanto, ressalva que outras atitudes de Barbosa podem ser consideradas medidas mais amplas de combate à corrupção. O professor destaca como maior exemplo a fixação da Meta 18 do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), que colocou como prioridade para para o STJ e à Justiça Federal o julgamento sistemático de processos contra a administração pública e de improbidade administrativa.